Cobrar uma dívida do consumidor nunca foi um processo fácil. Agora, o desafio é ainda maior em meio a um intenso processo de transformação digital. Esse foi o ponto de partida do Simpósio de Cobrança Digital

Todo e qualquer setor da economia vive às voltas com um forte processo de transformação digital e isso não é uma exceção entre as empresas especializadas em recuperação de crédito no Brasil.
Em um passado não muito distante, o atendente de call center era o responsável por cobrar um determinada débito. Hoje, essa é apenas mais uma tarefa de um robô que, por sua vez, promete ser mais eficiente que os humanos. Mas será mesmo?
Cobrar uma dívida nunca é uma tarefa com uma alta carga emocional. Robôs podem ser altamente eficientes em cobrar o maior número de endividados, mas dificilmente irão pedir para um consumidor se acalmar, pois não possui o dinheiro para quitar o débito. Humanos são menos eficientes mas, por outro lado, possuem a peculiaridade da flexibilidade emocional e escoam diálogos por escaninhos menos matemáticos e mais passionais.

Em outras palavras, no mundo de hoje, não se pode abrir mão de máquinas e de humanos. Esse foi o ponto de partida do Seminário de Cobrança Digital, uma iniciativa do Grupo Padrão.
A abertura do evento coube a Jacques Meir, diretor executivo de conhecimento Grupo Padrão. Em sua fala, ele destacou o processo de transformação digital, não necessariamente um processo exclusivamente tecnológico.
Na verdade, isso também é um processo de redescobertas das nossas humanidades. Acima de tudo, é preciso construir um modelo que seja híbrido. “É preciso que as empresas tenham uma visão híbrida entre tecnologia e o fator humano. Isso é lógico porque o contato é sempre com um humano”, afirma.

Após a abertura, o primeiro painel abordou justamente esse processo de transformação digital e o seu impacto na cobrança. Mediado por Gabriella Sandoval, editora-chefe da revista Consumidor Moderno, o painel procurou abordar o momento desse processo e, por fim, qual o futuro reservado para esse importante braço para o setor de relacionamento com o cliente.
Célio Lopes, diretor de Serviços Financeiros da Lojas Marisa, destacou a importância do uso de dados digitais na busca por um perfil preciso do seu consumidor – o que, evidentemente, inclui a melhor forma de abordar um cliente com um débito. Para tanto, é preciso “perfilar” o consumidor por meio das análises prescritiva e preditivas.
Em linhas gerais, a análise prescritiva ocorre quando as empresas podem obter recomendações inteligentes para otimizar os próximos passos de sua estratégia. Já a análise preditiva ajuda a criar uma estratégia mais efetiva baseada em dados.
“O comportamento prescritivo é muito importante para o universo da cobrança, pois impacta bastante o nosso negócio. Esse tipo de análise ajuda a manter o cliente por mais tempo”, afirma.
Já Mylena Maurutto, vice-presidente da Lendico, explicou que a companhia se notabilizou pelo uso de diversas tecnologias na hora de oferecer o crédito ao consumidor. No entanto, isso não necessariamente fez a empresa compreender com exatidão sobre o tomador do empréstimo. E isso ficou evidente quando a empresa começou a desbravar novos mercados no Brasil.
“Nos últimos anos, ocorreu uma mudança importante no mercado consumidor do Nordeste, o que criou um desafio na cobrança do crédito. É algo totalmente diferente, por exemplo, de uma abordagem feita em outros mercado.
Paralelamente a isso, a própria a área de atendimento mudou. No passado, todos os escritórios tinham postos de atendimento. De repente, vimos tudo isso ser desmontado e as posições de atendimento humanas sumiram”, disse Marutto.
Se todas essas mudanças já deixaram o setor de cobrança de ponta cabeça, imagina atender modelos de negócios que mudam constantemente, como é o caso de telecomunicações.
Thales Freitas, diretor de transformação digital da Sky, explicou que empresas que oferecem um serviço de uso contínuo vivem constantes dilemas em seus negócios.
Afinal, a oferta de TV por assinatura não obedece a uma regra matemática onde “quem paga, tem”. É preciso atenção e cuidado para entender o melhor momento para a abordagem com o cliente, evitando ao máximo a possibilidade de interrupção de um sinal.  Ou alguém gostaria que o serviço fosse suspenso no dia do último episódio da série favorita?

“O nosso negócio tem nuances com suas peculiaridades de um serviço recorrente. Ele pode estar inadimplente e o sinal é interrompido justamente no dia do último episódio. Quem lida com a cobrança precisa entender esse tipo de contexto. É um desafio lidar com esse tipo de situação”, afirma Freitas.

E o futuro?

O futuro do setor passa por justamente diminuir as distâncias entre novas tecnologias e pessoas, o que, inevitavelmente, vai mudar o jeitão de realizar uma cobrança de dívida. Nesse sentido, o caminho é usar algoritmo com uma generosa dose de pitada humana.
Segundo Freitas, é preciso construir um gerenciamento das interações dos clientes em todos os canais. Isso implica em entender qual o canal preferido do consumidor para um determinado fim. Afinal, na hora de pagar uma dívida, o cliente prefere um chat online ou faz uma ligação para a companhia?
“Hoje, por exemplo, existe um aplicativo que gerencia todas as suas dívidas. Você se associa a ele e, então, é informado sobre os débitos e quando eles vencem. Nele, o consumidor é quem tem o controle de tudo por meio de um plataforma”, contou.
De fato, tecnologia deve ser o meio para um consumidor empoderado. É o que afirma José Moniz, head de negócios digitais da Negocia Fácil (MFM), que explica que a grande inovação do setor é a mudança cultural no jeito de cobrar um débito – algo que a empresa já vem realizando e com bons resultados.
“Paramos de falar a palavra negativação. Agora, usamos oportunidade e isso foi o ponto de mudança na empresa. Em 2018, nós dobramos a operação na comparação com 2017. É importante desenvolver uma nova relação com o consumidor”, afirma.
E por que usar essa nova linguagem? Porque, afinal, cobrança também tem o poder de gerar um valor para a empresa.
“Não faz muito tempo e nós fizemos uma campanha de fidelidade com uma grande quantidade de adesão de clientes. A ideia é que um percentual do nosso programa de fidelidade seria usado para ajudar o inadimplente a quitar a sua dívida. Foi um sucesso. O importante aqui é pensar diferente”, disse.

FONTE: Consumidor Moderno